domingo, 1 de junho de 2014

Breve apontamento sobre Porto d’Ave


Desenho original de 1937



Por José Abílio Coelho

A história, tal como o tempo, anda a passo travado. E se a vida que decorre do tempo assenta em pequenos, médios ou grandes episódios, aos quais podemos juntar os mais variados “estados de alma”, a história faz-se também de pequenos ou grandes contributos e alguma emoção. Sem emoção não há histórias, há relatórios.
Mas que tipos de história podemos fazer?
Há a chamada “grande história”, que nos fala do mundo, das nações, das grandes figuras e feitos do ser humano, cultivada em geral pelos génios ou por aqueles que se acham génios, e a “pequena história”, somatório do que parece insignificante, mas, matéria sem a qual não se conseguiria entender hoje mais que o essencial. Apesar de alguns académicos continuarem a desvalorizar aquilo a que chamam “história local” ou “pequena história”, que não é a mesma coisa mas que eles, na sua infinita sabedoria colocam na mesma arca, académicos esses que eu gostaria muito de ver fazerem as tais sínteses com que se armam em pavões sem os pequenos contributos... bom, mas isso são orações para outros altares e o que aqui importa dizer é que, a “pequena história”, ou aquilo a que chamam “pequena história” tantas vezes de forma pejorativa e que eu tenho simplesmente como História, vai-me surpreendendo todos os dias. Em particular a da minha terra.
 O que aqui fica, hoje, depois de uma tarde de domingo a “catar” fontes, é um pequeno contributo para a história da Póvoa, focado no lugar de Porto d’Ave, o mais importante da freguesia de Taíde.
Não falarei do que já está escrito, e muito é, tantos os livros publicados sobre a localidade. Apenas traço é um apontamento que pretendo que funcione como simples curiosidade.
Refiro-me à abertura do acesso do santuário da Senhora do Porto à estrada nacional Póvoa-Fafe. Até meados da década de 1930 ir ao santuário de Porto d’Ave, descer da estrada ao templo, só era possível a pé ou no máximo a cavalo, por estreitos caminhos. Não ia lá um automóvel, por exemplo. E o automóvel começava a tornar-se um bem de consumo diário para muita gente. Mas também lá não descia um bom carro de tração animal, uma carreta dos bombeiros. Descer a pé era remédio que todos tomavam.
Em meados da década de 1930, o médico e professor Dr. Francisco Vieira e Brito, um dos maiores, senão o maior benfeitor da irmandade, da qual foi juiz durante anos e anos, sonhou com a construção de uma estrada de acesso ao mosteiro. Por onde? Não era fácil, dadas as diferenças de cotas dos terrenos e sobretudo devido aos terrenos que podiam ser utilizados pertenceram a vários proprietários, com as dificuldades que sabemos existirem ao tempo para qualquer proprietário se desfazer de uns metros de courelas.

Francisco da Cruz Vieira E Brito


Vieira e Brito sonhou, lutou, investiu, empenhou-se e conseguiu o que planeara. Em dezembro de 1938 estava decidido que a avenida- isso, avenida – seria pelo lado poente, entre a estrada nacional e o adro do santuário. A planta estava pronta e há mais de um ano que havia sido enviada para Lisboa, para o ministério da tutelo, a fim de ser aprovada e de lhe ser concedido um subsídio para a construção. Não que o Dr. Vieira e Brito não fosse homem de a construir sem subsídios. Muito e muito mais que isso deu ele à irmandade, em vida e depois da morte. Mas porque quando chegou a juiz encontrou tudo tão ao abandono, tão velho, que há muito vinha gastando do seu bolso para renovar, alindar, substituir. Entre muitas dezenas de contos para portas, arranjos de muros, substituição de tetos, rebocos e pinturas de paredes. Deu 5 contos de réis (uma boa maquia, à época) para esta avenida. Mas, usando o seu prestígio – tinha sido diretor dos laboratórios de análises clínicas da Universidade de Coimbra, era professor em Braga…), continuou a lutar para que Lisboa ajudasse.
E em junho do ano seguinte (1940), o ministério das obras públicas lá aprovou, através do fundo de desemprego, um subsídio de 43.752$00 para a abertura da nova avenida e para que aquela a que ainda hoje chamam “arruado” fosse devidamente calcetada.
A obra arrancou pouco depois, tendo sido executada pela câmara, por administração direta.
Pouco depois, foi também aprovada a construção da rede elétrica ao lugar de Porto d’Ave, com 13.654$00, para cuja aprovação Vieira e Brito deu forte contributo.
O Dr. Francisco Vieira e Brito não sendo de Porto d’Ave, foi um dos grandes nomes da sua irmandade.
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Para conhecer melhor a figura de Francisco Vieira e Brito aceder o link:

http://dicionariodepovoenses.blogspot.pt/2012/02/francisco-da-cruz-vieira-e-brito-1893.html

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Alfredo da Silva Araújo



Noutra dimensão situou-se o Sr. Alfredo da Silva Araújo, fundador da fábrica da Abelheira. Também ele deu muitos contos de réis ao santuário, pagando do seu bolso muitas das obras que na década de 1930 ali foram feitas.
Era natural de São Miguel, da Vila das Aves, onde também possuía uma empresa: a fiação de Rebordões.
Aos bombeiros da Póvoa, ofereceu um automóvel – a primeira "automaca" – e um seguro de vida que cobria as necessidades de todos os soldados da paz da corporação. Em inícios de 1940. Não chegou a assistir ao “batismo” da ambulância, já que faleceu em inícios de março desse mesmo ano, uma década depois de ter instalado às portas de Taíde a fábrica da Abelheira, que tanta gente empregou.
Deixou quatro filhos: António, Armindo, José e Artur da Silva Araújo. Foi a enterrar na sua terra natal, São Miguel da Vila das Aves.
Foi outro grande benfeitor portodavense.